quinta-feira, 28 de novembro de 2013

O LAMBEDOR DE BUCETAS

PARTE VI

JEAN E SIMONE

Creio que Simone àquela altura de seu relacionamento com Jean já estivesse bastante enfastiada com as incansáveis linguadas dele em sua buceta sempre quando soava o seu sedutor apelo  para que ela vestisse a conserlete vermelha a combinar  com os espartilhos da mesma cor e assim prostrar-se de saltos altos na pia da cozinha no árduo e doce exercício de cortar as cebolas naquele pequeno, porém, elegante apartamento de apenas um cômodo  na Quartier Latin, onde Jean vivia sozinho. Penso assim, porque Simone naquela tarde especial de maio agora observava Jean enrolado em seu robe cor de vinho, fumando tranquilamente o seu cachimbo da sacada daquele apartamento acolchegante, tão compenetrado que ele estava ao apreciar a multidão de jovens lá embaixo ganhando as ruas e avenidas da Champs ElIsées lutando pela liberdade dos valores e pelo fim da opressão politica na Argélia.  Eram tempos conturbados e de mudanças aqueles...
É evidente que Simone tinha projetos novos na cabeça e reorganizava seus pensamentos feministas acerca de toda aquela sua relação com Jean, enquanto ouviam Sargent Peppers(é bom que se diga) junto ao balbúrdio das ruas, de maneira que nesta mesma tarde ela decidiu mudar de conduta sexual, propondo a ele que os papéis fossem invertidos:

Como assim, querida?
Que talvez eu devesse experimentar um pouco dessa sensação prazerosa que tu sentes ao penetrar rasteiramente a tua lingua em minha buceta.

Foi o que ela exatamente disse nesta tarde acinzentada de maio reforçando as chamas de sua piteira.  E prosseguiu:

Que devessemos compartilhar os mesmos sentimentos, acaso não é isso que pregamos sempre? A liberdade dos prazeres e os direitos iguais?

Jean deixou a sacada um instante e aproximou-se dela com seu cachimbo de aroma indiscutível para inspecionar melhor aquela sua proposta estranhamente indecorosa:

Está dizendo que estás enfastiada com as minhas linguadas?

Estou dizendo que me sinto no direito também de compartilhar do mesmo prazer.

O homenzinho enrolado em seu robe, fumando ainda elegantemente o seu cachimbo, pensou um pouco antes de dizer:

É justo...mas não sei se conseguiria levar uma linguada no cu, querida, se é isto exatamente o que está propondo.

BINGO!

Simone, é claro, para melhor tranquilizar o seu parceiro sorriu docemente, acariciando o pescoço dele que era gordo e pequeno. Uma leve fumaça aromante que vinha do cachimbo de Jean e da piteira de Simone, logo acoplaram-se copulando como dois espectros amantes a fundir-se em uma só fumaça espessa, cujo gozo resultou em uma espiral de luminosidade de tons coloridos e ofuscantes...E Jean sorriu desconsertado como a um menino que leva caçuletas dos mais grandes ao ouví-la dizer:

Uma linguada no cu, querido, não vai demover de sua órbita machista o seu prestígio de filósofo junto aquelas jovenzinhas existencialistas de cabecinhas vazias...

O que você na verdade quer me dizer, Simone? Não foi este Bourbon praguense que lhe deixou com estes pensamentos desvairados, foi?

Você me conhece a vinte anos, Jean. Chega de interpretações aos olhos dos outros.

Tens razão, contudo, se eu permitir, você não vai registrar tudo isto em seu novo livro, pois não?

Prometo. Será este o nosso segredinho...

E assim sucedeu que Jean permitisse à Simone que ela colocasse em voga o seu projeto.
                                                                  MALDITOS POMBOS!

Devo aclararvos, portanto, que o nosso homenzinho era pouco desfavorecido pelos paramentos da beleza que valem a um indivíduo de nosso gênero, vulgarmente o título de "belo homem", pois que Jean era um sujeito baixo, meio gordo, olhos míopes e redondamente claros os quais refugiavam-se cinicamente por trás de suas lentes grossas que usava, entretanto, o que o desfavorecia desse lado de feiura, a natureza compensava-lhe do outro, sendo Jean dotado de um intelecto espantoso e de ideias brilhantemente revolucionárias capaz de mudar o curso das vidas que o cercavam, mergulhando-as na fumaça de seu laborioso cachimbo de ideias. Simone, por sua vez, era de uma beleza fina e delicada como o próprio nome preconizava. Uma mulher de extrema elegância ao cruzar das pernas torneadas (devo dizer-lhes) olhos bonitos e penetrantes como bisturis cirúrgicos - menos adornos do que pretensão - eu diria -  mas de um caráter exigente e imperioso. Somado a isso, ainda havia também o brilhantismo intelectual e ousado, aliado ao fervor das ideias feministas  que viriam mais tarde protagonizar a liberdade sexual das mulheres. Era muito comum ver o casal desfilando suas ideias pelos Cafés badalados e elegantes da St.Honoré, ou da própria Champs Elisées, sempre cercados de existencialistas ou de jovenzinhas feministas de plantão que ouviam envaidecidamente o casal discorrer sobre a dissemetria sexual, Leibniz e política - e sobretudo, a crença sobre a condição absoluta do amor fincado nos alicerces da liberdade sexual... E as fumaças cobriam todo o Café ao som do trompete alegre  de Joe Williams que se vocês apurarem bem os seus ouvidos, o ouvirão tocar bem lá no fundo de suas almas embriagadas de paixão...

                                               
                                                    desenho: Jean Lumet


terça-feira, 26 de novembro de 2013

O LAMBEDOR DE BUCETAS

PARTE V

Nesses longos e torturantes dias chuvosos em que fiquei ali de prontidão na varanda de minha casa na incansável espera idolátrica por Josephine mantive-me fiel ao Marquês que me domesticava e encorajava-me o espirito com suas fustigadas que misturavam-se com os relâmpagos e açoites surdos da chuva no telhado de zinco da minha casa, devolvendo-me, assim - o velho e bom Marquês - o bom senso e a esperança que eu havia perdido da humanidade. Vivia ali então inocentemente todas as prefigurações do amor-paixão, ausência-presença, sofrimento-morte, evidenciando pois, um comportamento que merecia total desprezo por conta do Marquês  que me instruía ao relembrar que só a presença do objeto do desejo é o que conta. Presença e presente. Movimento e gozo. Pois que o objeto do desejo é o ser, e que o platonismo á moda de Goethe, a compaixão, a fraternidade, a caridade e demais sentimentos equívocos da razão, são sentimentos reservados aos que preferem se escravizar ao invés de deixar fluir o curso livre de suas paixões. Em síntese, o Marquês quis dizer-me sabiamente que as virtudes são sentimentos reservados aos fracos de espírito. E eu havia que concordar com ele e que portanto me era obrigado a acatar aquelas suas sábias e ríspidas palavras, até porque considerando-me um lambedor de bucetas, sabia por excelência o que ele reafirmava-me acerca da liberdade. E seguimos, pois, em meio ao temporal debatendo aquele ponto tão crucial á nossa existência.
                                                                       ***

A medida em que a chuva aumentava sua doce cólera, eu me diluía gradativamente invólucro na minha solidão miserável e desumana, a qual partilhava com o Marquês e com o meu cão Príapo que prostrava-se quieto ao ouvir atentamente os conselhos do velho libertino. Sim, todo homem tem um cão para preencher os ossos do vazio. Eu tinha o meu, chamado Príapo. Tudo que resta de um casamento catastrófico, senhores, é um cachorro. Príapo, portanto, partilhava desta minha mutilação secreta e desta minha nova expectativa acerca daquela espera. E a esta altura, se ia mais uma garrafa de Sauvignon e mais uma punheta frustrante. Mas neste meio termo, gostaria de falar sobre a função da língua ao deslizar sobre a buceta e dizer-lhe do fundo do meu coração palpitoso e flamejante que, ao contrário do que se pensa, a língua não domestica. Não se iluda. Por mais que o cavalheiro deste outro lado da tela suponha ser um exímio lambedor de bucetas, e isto a mim não caberá duvidar - não julgue que com isso você a aprisionará para sempre. Considere isso uma tolice bestial e ingênua, própria do gênero masculino que muitas vezes me envergonha e a qual reprovo a fundo. A língua não domestica, volto a dizer. Ou melhor, não aprisiona. (Infeliz da mulher que se entrega a esse sentimento prisional.) Ao contrário, ela liberta. Provocará neste pequeno pomarzinho do amor, outras variações e buscas por prazeres adversos. A buceta nasceu para ser livre como um passarinho, e em função disso, fazer suas escolhas e experimentações que a priori poderá nos soar estranhos e doentios, mas que são perfeitamente naturais. Faz parte do prazer, e todo o prazer, como há pouco me afirmava o Marquês, é uma eterna e incansável busca pela consolidação do espírito e da carne. Por mais que seja obsequioso e primoroso o efeito de uma lambida, a buceta sempre rejeitará todo tipo de relação que implique a ela total dependência entre indivíduos - mas não por desprezo absoluto ao amor, marca da carência e da subserviência humana, quero deixar claro, mas porque toda buceta nasceu para ser livre. Foi a esse ponto da verdade a que chegamos, eu e o Marquês. E com base nisso, e também aproveitando o breve ensejo vou lhes narrar a história de Jean e Simone, que tudo tem a ver com este parêntese acidental a que forçosamente fui obrigado a abrir...

                                                        desenhos: Namio Harukaua

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O PRAZER VEM COMO LADRÃO

PARTE IV

Sim, ela havia deixado bem claro isto e que portanto me mantive ereto a sua espera como um cachorro que aguarda o retorno de seu dono e por conta disso, quase congelei uma noite dessas na varanda de minha casa na esperança vã de vê-la chegando, dobrando a esquina da minha rua úmida de desejo...
"Você congelou mesmo na varanda, à minha espera, Mário Augusto? Tudo isto não é um exagero seu?"
"Não, meu doce. Fiquei a tua espera até tudo secar... até ver a última gota de ovalho cair do telhado... congelei na varanda de casa a tua espera, sim..."
Ela m-o-v-e-u d-e-l-i-c-a-d-a-m-e-n-t-e o-s c-í-l-i-o-s a-b-r-i-n-d-o e-m s-e-g-u-i-d-a u-m l-e-v-e e- e-t-e-r-n-o s-o-r-r-i-s-o n-a-q-u-e-l-e-s l-á-b-i-o-s d-e f-l-o-r que se eu não fui capaz de descrever esta imagem aos senhores com a perfeição que sempre almejei que eu então seja amaldiçoado para o resto de minha vida... Que estas minhas mãos se encham de lepra onde não possa mais segurar com destreza a pena que me toma a alma em descontrole e que me coloca em rota de colisão com a morte todas as vezes que aqui eu sento para lutar com as palavras e descrever tua beleza que é uma labareda ardendo dentro de mim...
"E o que você ouvia na ocasião, meu querido Não vais me dizer que era Claire de Lune do Bethoven que é docemente sofrível..."
"De acordo, mas na ocasião ouvia apenas as batidas doídas do meu coração, intercaladas com o som ensurdecedor dos grilos copulando..Grilos copulam depois da chuva. Mais vinho?"
"Por favor..."
O som que os senhores ouvirão agora são dos lábios de Josephine sorvendo delicadamente o vinho e se os senhores pudessem ao menos sentir a ínfima fração de  alegria de um homem no declínio de sua idade na presença de uma mulher de tamanha beleza extraordinária que sou até capaz de sair atropelando as palavras como agora em que tudo me foge ao controle que nem mesmo sei se saberia dizer o que sinto e que nada sou neste momento de glória embriagada de desejos sobrehumanos mas é necessário, por exemplo, falar de suas pernas firmes e maravilhosas outra vez entrefechadas e a minha língua por ali ser penteando marotamente como quem não quer nada até chegar ao seu sexo e ao cheiro do seu sexo lisinho e perfumado úmido e secreto, convenhamos, e da política interna do crotón encrespadinho que se esconde bem lá no fundo, a petalazinha do amor, e me delicio com a minha punheta depravada que soco agora com uma das mãos enquanto a outra dedilha sobre estas teclas e é nessas horas, eu confesso, que o instinto subjulga a razão e este nobre escriba deixa de lado o seu cavalheirismo e toda sua polidez e gentileza das palavras e me torno um canalha, contudo, convido a senhorita em especial (pois não pense que não sei que você me lê agora, espertinha, e como explicar este sorriso lindo brotando devagar no cantinho de seus lábios de Penelópe, hein?) e portanto não há motivo para envergonhar-se  e juntos proponho tocarmos aquela punhetinha cada um a sua maneira ou então imagine mesmo minha língua deslizando suavemente sobre sua rosa rubra de boquinha aberta feito passarinho mmmmm...que teu gosto sagrado de fêmea e o teu cheiro e tudo mais se entranha e permanece em mim eternamente e sou até capaz de sentir o momento exato que o teu gozo desagua no meu e fundirmos os nossos desejos num só corpo, numa só pele, num só átomo... e acho mesmo que definitivamente me perdi no emaranhado da tua púbis mas deixo aqui  selado  um pacto sem conjecturas e renovo meu convite a retornares a esta página sempre que sentir o fogo das palavras lhe consumindo por inteira, não se envergonhe minha pequena, sempre lhe terei com enorme desejo e carinho e aqui encerro este epítome ou seja lá o que raios for......


Sim, ela havia deixado bem claro isto e que portanto me mantive ereto a sua espera como um cachorro que aguarda o retorno de seu dono e por conta disso, quase congelei uma noite dessas na varanda de minha casa na esperança vã de vê-la chegando, dobrando a esquina da minha rua úmida de desejo...
_ Você congelou mesmo na varanda, à minha espera, Mário Augusto? Tudo isto não é um exagero seu?
_Não, meu doce. Fiquei a tua espera até tudo secar... até ver a última gota de ovalho cair do telhado... congelei na varanda de casa a tua espera...
Ela m-o-v-e-u d-e-l-i-c-a-d-a-m-e-n-t-e o-s c-í-l-i-o-s a-b-r-i-n-d-o e-m s-e-g-u-i-d-a u-m l-e-v-e e- e-t-e-r-n-o s-o-r-r-i-s-o n-a-q-u-e-l-e-s l-á-b-i-o-s d-e f-l-o-r que se eu não fui capaz de descrever esta imagem aos senhores com a perfeição que sempre almejei que eu então seja amaldiçoado para o resto de minha vida... que estas minhas mãos se encham de lepra onde não possa mais segurar com destreza a pena que me toma a alma em descontrole e que me coloca em rota de colisão com a morte todas as vezes que aqui eu sento para lutar com as palavras e descrever tua beleza que é uma labareda ardendo dentro de mim...
_E o que você ouvia na ocasião, meu querido? 
_As batidas doídas do meu coração, intercaladas com o som ensurdecedor dos grilos copulando..Grilos copulam depois da chuva. Mais vinho?
_Por favor...
(O som que os senhores ouvirão agora são dos lábios de Josephine sorvendo delicadamente o vinho e se os senhores pudessem ao menos sentir a ínfima fração de  alegria de um homem no declínio de sua idade na presença de uma mulher de tamanha beleza extraordinária que sou até capaz de sair atropelando as palavras como agora em que tudo me foge ao controle que nem mesmo sei se saberia dizer o que sinto e que nada sou neste momento de glória embriagada de desejos sobrehumanos mas é necessário pór exemplo falar de suas pernas firmes e maravilhosas outra vez entrefechadas e a minha língua por ali serpenteando marotamente como quem não quer nada até chegar ao seu sexo e ao cheiro do seu sexo lisinho e perfumado úmido e secreto, convenhamos, e da política interna do crotón encrespadinho que se esconde bem lá no fundo, a petalazinha do amor, e me delicio com a minha punheta depravada que soco agora com uma das mãos enquanto a outra dedilha nestas teclas e é nessas horas, eu confesso, que o instinto subjulga a razão e este nobre escriba deixa de lado o seu cavalheirismo e toda sua polidez e gentileza das palavras e me torno um canalha, contudo, convido a senhorita em especial (pois não pense que não sei que você me lê agora, espertinha, e como explicar este sorriso lindo brotando devagar no cantinho de seus lábios de Penelópe, hein?) e portanto não há motivo para envergonhar-se  e juntos proponho tocarmos aquela punhetinha cada um a sua maneira ou então imagine mesmo minha lingua deslizando suavemente sobre sua rosa rubra de boquinha aberta feito passarinho mmmmm...que teu gosto sagrado de fêmea e o teu cheiro e tudo mais se entranha e permanece em mim eternamente e sou até capaz de sentir o momento exato que o teu gozo desagua no meu e fundirmos os nossos desejos num só corpo, numa só pele, num só átomo... e acho mesmo que definitivamente me perdi no emaranhado da tua púbis mas deixo aqui  selado  um pacto sem conjecturas e renovo meu convite a retornares a esta página sempre que sentir o fogo das palavras lhe consumindo por inteira, não se envergonhe minha pequena, sempre lhe terei com enorme desejo e carinho e aqui encerro este epítome ou seja lá o que raios for......

O LAMBEDOR DE BUCETAS

III

CORRESPONDÊNCIAS

E tudo inicia-se com as minhas breves correspondências que mantive com Josephine:

"Prezada Josephine, escrevo-lhe estas breves e  tortuosas linhas para dizer-lhe que iniciei os primeiros rascunhos de O LAMBEDOR DE BUCETAS, e penso que já estou bem adiantado. Não quero antecipar os capítulos, mas já lhe adianto que terminarei ainda este mês. Este novo trabalho fará parte do livro de contos chamado A GARÇONETE SEM CALCINHA, onde empreendo uma viagem ao universo erótico. Sei que vais gostar...
Quanto ao "Marido Complacente", do Marquês de Sade, só vou lhe emprestar se vieres buscá-lo aqui em casa, pessoalmente. Já até separei aquele bom vinho para a ocasião. Pois que venha!

Seu eterno admirador,

Mário Augusto


"Querido Mário Augusto, muito feliz com a tua carta que recebi por estes dias. Continuas irressistível e encantador, e o aroma de tuas palavras ainda me embriagam a alma e deixam meu sexo em desalinho. Ainda escreves sem pudor como um pequeno e doce demoniozinho. É claro que diante deste teu sincero apelo, aliado á necessidade deste meu encontro com o Marquês, não me resta outra alternativa senão ir á tua casa fazer-lhe uma breve visita qualquer dia desses.
Em se tratando do vinho, espero ter reservado para esta ocasião, um bom e legítimo Port Noir, que ainda é o meu vinho preferido.
Um beijo de sua também admiradora que lhe tem com extremo louvor e dedicação."

Josephine



"Ah, minha doce amada Josephine, acabei por tornar-me escravo dos dias e das horas que se seguem e que me inundam infindavelmente o espirito naufragante de desejos, movido que fui pela promessa de sua possível vinda a esta minha humilde residência. Já antevejo-me, porém,  entregue ao gozo e aos desvarios deste encontro, de maneira que sigo embalado por pensamentos febris e docemente pecaminosos que só alimentam mais e mais o desejo frêmulo da fome insaciável de minha glande em chamas, entregue a que fiquei a mais agradável e profunda das lassidões...
Vem depressa, minha amada, que serei para ti, a tua agonia e a dissolução do teu gozo eterno o qual transbordará na suave lingua da verdade..."

(na língua está a verdade)
 Eternamente seu,

Mário Augusto

em resposta a esta minha última carta, ela então corajosamente escreveu-me estes versos ousados:

"trata-se de alcançar com sua língua, as amígdalas de minha buceta..."

...meu doce e obsceno amante,
tuas palavras são como caramelos recheados de sêmen
 a derreterem no céu de minha boca
 
        fecho meus olhos
              abro minhas pernas
         
        minha buceta
          de lábios bem abertos
                semininfa, semiputa...semitua
                                  vadia santa
             Nossa Senhora dos amores encaracolados
               mas se quiseres
                 entregarei-a depiladinha
                     ao santo altar
                     dos  vossos beijos e afagos...

Trata-se de alcançar com sua língua
as amígdalas de minha buceta...
                   
          (na língua está a verdade)

                                         Josephine

Diante destas palavras, eu então calei-me e resolvi esperar...

E

O LAMBEDOR DE BUCETAS

PARTE I

JOSEPHINE

 Talvez lhes devesse falar de Josephine, afinal.Pois bem. Ela de fato apareceu em minha casa para  minha grata e deleituosa surpresa. E estava divinamente maravilhosa trajando um vestidinho preto e curto colado ao corpo com desespero e sensualidade. Eram seis daquele dia e chovia maliciosamente uma chuva amiudada e doce vestida de lingerie... e Josephine estava ali, atrás da porta, e lhes asseguro que esta mulher é de extraordinária beleza que não sei bem definir...Enfim, ela me disse:
"Vais ficar aí parado só olhando, Mário Augusto? Não vai me convidar para entrar?"
Torno a repetir, ela estava divinamente sensual naquele vestidinho preto e curto colado ao corpo com desespero e sensualidade que meu pau despertou de seu sono de três longos dias de abstenção... Francamente não sei se Josephine estava ali por causa de mim ou pelo Marido Complacente do Marquês, o qual eu havia fielmente prometido a ela. Ah, bolas, mas isso não importa, eu não poderia deixar escapar aquela oportunidade ímpar de fazê-la entrar e de tê-la só para mim em minha alcova pecadora, após dias intermnáveis de espera...
"Ah, me desculpa, pode entrar! É que ainda estou extasiado com sua aparição..."
"Deixa de bobagens! Achou que eu não viria?"
"Para ser franco, sim. Mas isso é o que eu chamo de profunda devoção ao Marquês..."
Ela foi entrando devagar e o seu perfume inebriante de fêmea foi se espalhando e tomando conta da casa toda...

II

Ah, Cristo,  eu já ia até me esquecendo dos saltos que ela usava e que a deixava em privilegiada altura infinitamente superior a minha. Eles desfilaram vagarosamente ao longo da sala dedilhando com as suas pontas venenosas e afiadíssimas o assoalho da casa como alguém que dedilha um Bolero de Ravel... A divinal e encantadora criatura então sentou-se ao sofá e cruzou suas longas e tentadoras pernas que eram de formas modeladas e a que esse espetacular atrativo aos olhos juntava-se ainda a vivacidade simulada do espírito e um amor ainda vivo e latente pelos prazeres proibitivos da carne - tudo isso a mergulhar-me em profundo estorpor e extase, e que portanto, já tonteamente inflamado, e por não achar uma expressão  convenientemente cabível e menos primitiva para expressar aquele momento de rara contemplação a que é dado aos animais da mais vil e baixa casta, escapou-me furtiva e animalescamente esta frase pobre e infeliz, mas tão natural quanto a existência de um cachorro:
"Você como sempre linda, Josephine!"
"Você e seus elogios baratos, Mário Augusto! Onde está o Marquês?"
"Esta aqui, é claro,  pelo Marquês que lhe prometi, eu já ia esquecendo..."
"E também pelo Port Noir, lembras?
Putz, como dizer a ela que a grana não deu para comprar o Port Noir, por se tratar de um vinho caríssimo, mas a vida nos imprime ao espírito, a cautela e a perspicácia de um exímio enxadrista que calcula as variantes do seu oponente  antes mesmo de cada movimento seu. O que quero lhes dizer, senhores,  é que eu havia deixado gelando um  Barolo, Safra 90, para aquela ocasião. O gosto não é superiormente o mesmo de um Port Noir, mas é doce e encantadoramente suave e que estava dentro de meu orçamento. No fundo, vinho é vinho, e se tratando de Josephine, especificamente, ela não faria qualquer objeção a respeito. Sei perfeitamente de seu jogo; cada movimento frio de sua peça na captura do meu rei.  A natureza doce e ardil de Josephine, sem que ela mesma saiba, acaba me ensinando como penetrar no âmago feminino sem causar maiores transtornos. Este é o jogo sublime da sedução a que estamos absorvidos eternamente. Ah, Josephine, retorno para afirmar  aos senhores que nunca na vida vi algo de semelhante beleza, e que a própria mãe dos amores não me teria dado tantos prazeres lascívos só em contemplar...
As mulheres são uma rocha que devem ser penetradas bem devagar...
"Esta frase é sua ou do Marquês?"
"Por que? Você gostou?"
"Me pareceu atraente e original...O que tens escrito?"
"Nada de relevante...Mas vou buscar o vinho..."
"Sabe, Mário Augusto, no fundo me amarro nesse teu saudosismo anacronicamente romântico e sarcástico, ele me adoça a alma e me faz acreditar na humanidade falida dos homens..."
"Sério, meu doce? Saiba que todo homem é um amálgama..."
"Mas então, me diga, pareço uma puta vindo até aqui vestida desse jeito?"
"A mais vil e encantadora das putas do mais alto clero..."
"Você é sua língua afiada, Mário Augusto. Mas no fundo tens razão: Toda mulher é uma puta dissimulada."
"Esta conversa toda me fez lembrar os passeios matutinos da senhora de Tourville. A pintura mais honesta da mulher pintada pelo Marquês... Vou providenciar o vinho."
Deixei-a um instante sozinha na sala e fui de fato apanhar o vinho, não sem antes, é claro, colocar o Bolero de Ravel para tocar, para segundos depois, ouvi-la da cozinha com sua voz rouca e atraente, dizer-me:
"Faz isso de propósito porque sabes que sou uma apaixonada por Ravel."
"Oi?" (Eu a ouvira, é claro, só queria ter a certeza que ela ainda estava lá, apetecível como um bombom, a minha espera.)
"Adoro Ravel, eu disse."
A chuva havia engrossado um pouco, e ela por certo (a chuva) iria aumentar sua voluptuosidade e glamour, encerrando-nos definitivamente ali, por longas e prazerosas horas. Voltei imediatamente com o vinho e o depositei sobre a mesinha de vime, colocada no centro da sala.
"Ravel é uma torrente de gozo que vai crescendo dentro de nós...E tudo graças a Ida que o encomendou a Ravel para criação de um balé á moda espanhola e ele então reajuntou algumas peças antigas e recentes para piano e criou uma nova obra que na época, causou uma grande polêmica, pois que Ida apimentou a música como uma coreografia sensual..."
"E tornaram-se amantes?"
"Não tenho essa informação, mas certamente que sim. Ravel era um homem interessante e Ida, uma mulher virtuosa..."
"Sempre me encanta esse seu eruditismo. Mas isto não é um Port Noir! Não havíamos combinado um Port Noir? O que houve? Não minta!"
Como nos é impossível fugir da mentira  que é uma verdade disfarçada, então eu disse:
"É que não havia um Port Noir, então fui obrigado  a optar por um Barolo Safra 90."
"Um vinho Carcamano..."
"Contudo, um vinho. Prove e irá gostar..."
"Como se não entendesse de vinhos...Encha meu copo!"
Tratei de encher o seu copo que ela segurava com extrema suavidade e delicadeza e imediatamente senti de perto o cheiro esmaltado de suas unhas pontiagudas pintadas de vermelho misturando-se com o aroma embriagante do vinho. Três dos aromas são imprescindíveis ao olfato masculino:  o cheiro esmaltado das unhas de uma mulher, o cheiro do vinho e o doce aroma de uma buceta...


segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE - FINAL

XNÃO SE MORRE NUNCA. A VIDA É UM DEVIR.

Acordei em uma cama de hospital. As paredes brancas ao meu redor. Um cheiro de soro. Doíam-me todos os ossos.  Dei com Ecumênicus sentado em uma cadeira de frente para mim, lendo o Capital, de Marx. Parou de ler um instante, fechou o livro e sorriu dizendo:
“Que bom que voltou. Podemos agora rediscutir a tomada do estado.” Ecumênicus não havia desistido daquela ideia idiota de tomar o estado.
“O que houve, porra!” Perguntei com uma voz que não era minha.
“Ficaste em coma alcoólico durante três semanas. Diarréia e vômitos. Achei que tua ia se dissolver.”
“Caralho! Quero sair daqui!”
“Tá ainda muito fraco. Vais ficar mais esta semana, o médico disse.”
E fiquei ali com Ecumênicus me fazendo companhia. Ele vinha todas as tardes ler para mim O Capital, de Marx. Falou da Mais-Valia. Da exploração do homem pelo homem. E veio-me com uma teoria maluca que o mundo está dividido em quatro tipos de horas: a hora pra dormir, a hora pra comer, a hora pra trabalhar e a hora pra se masturbar. Distraia-me com Ecumênicus que nem via o tempo correr. Recebi alta e fui morar uns tempos com ele numa kitinete, no Bairro da Glória. Dei um tempo nas minhas bebedeiras e refleti mais sobre a vida que eu levava. Decidi mudar. Arranjei trabalho e resolvi freqüentar os alcoólicos anônimos. Mais fiquei entediado com aqueles depoimentos idiotas. Não deu muito certo, não. Procurei igrejas diversas. Tentei até o espiritismo. Mas não me encaixei em nenhuma doutrina daquelas. Não nasci pra ser escravo. Sentia-me um buraco enorme e negro. Era como se a minha alma tivesse me abandonado. Fugido em um tapete voador. Evitava passar em frente á açougues porque entrava em profunda depressão. Lembrava-me do anão. Precisava estar desesperadamente com alguém. O sorriso doce de Selminha escolhendo as cebolas em um supermercado, como nos velhos tempos, me vinha à cabeça em noites solitárias de domingo. Resolvi ligar para ela:
“Oi, Selmnha!” Aqui é o Mário Augusto.”
“Vai tomar no seu cu, Mário Augusto!” Gritou de lá. E desligou. Nunca mais a veria. Saí para as ruas. Sozinho. A cabeça atrapalhada. Mas sem um pingo de álcool no sangue. Afastei definitivamente a ideia de morte. De me sentir vazio. Pensei em voltar a escrever. Mas não sabia exatamente sobre o quê. Contei para Ecumênicus a experiência louca que tinha vivido, e ele, sem mesmo acreditar em uma única palavra minha, sugeriu que eu escrevesse sobre aquilo. Não seria fácil. Mesmo assim, sentei a bunda e escrevi. Freneticamente. Entre uma punheta e outra. Voltei a me masturbar como um louco. Ao cabo de um mês, tinha uma novela pronta. O anão do Açougue. A história mais louca que já tinha escrito em toda minha vida. Me senti vivo outra vez. Enviei para todas as editoras e esperei. Espero até hoje. Mas tudo bem. A vida é isso. Um corredor de longa espera.

***
Mais disposto e trabalhando como zelador em uma escola pública resolvi dar uma volta no centro. Ali pelas imediações da Mauá e Frei José. Tomei coragem e parei diante do prédio onde funcionava o Delirium. Havia se tornado uma Igreja da Assembléia de Deus. Uns poucos bares em torno dele ainda resistiam por ali. Sentei em um deles e tomei uma cerveja. Minha primeira depois de longos e tenebrosos meses. Fiquei ali plantado bebendo e relembrando de como fui do paraíso ao inferno. Foi quando vi Dagmar parada frente ao Nacondas, fumando elegantemente um cigarro. Gostosa naquele seu velho jeans apertadíssimo. Meu pau deu uma pinicada. Estava vivo de novo. Não se morre nunca. A vida é um devir.
Levantei-me animado, paguei a conta e fui ao seu encontro. Não me importaria se caísse novamente naquele papo de epilepsia. Dagmar tinha uma boca milagrosa. Ah, tinha! Era uma tarde de dezembro ensolarada. Ela sorriu de lá. Subimos as escadas do Nacondas outra vez...


domingo, 27 de outubro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE



IX – MORRER É COMO ESTAR DENTRO DE UMA GARRAFA

Era fevereiro de 2002. Eu havia voltado á estaca zero. Distanciei-me do centro e agora andava de bar em bar pelos bairros poeirentos e esquecidos da periferia, com o anão dentro de uma garrafa. Tentava negociar com os caras. Convencê-los que havia um homenzinho ali dentro e que eles podiam ganhar muito dinheiro com aquilo. Riam de mim. Olhavam-me como um louco. Voltei a beber como um desgraçado. Xingava aqueles que não acreditavam em mim. “Homens sem fé!” Gritava bêbado. Cheguei a ser expulso de alguns bares aos pescoções. Amanhecia pelas ruas. Fodido. Jogado debaixo de marquises. Acordava sempre ao lado de uma garrafa de cachaça, e do outro, o recipiente contendo o anão que diminuía ridiculamente. Senti fome e frio. Não vi o carnaval passar. Me desesperava. Cheguei a ponto de procurar os circos e as casas de forrós. Apresentava-me aos empresários contando-lhes todo meu drama. Nem se preocupavam em olhar a garrafa. Iam logo dizendo: “Não nos interessa, seu Mário. O que faremos com um homenzinho preso dentro de uma garrafa?” Me sentia quando eu vendia os meus livretos pelos bares. Ninguém os comprava. O desespero foi tomando conta de mim. Tornei-me uma sombra amarga. Fui provando de um processo lento de degradação humana que não desejo ao meu pior inimigo. Definitivamente eu não estava preparado para tanto sofrimento. Ninguém está, não é mesmo? Eu me afogava em miséria total. Tornara-me um velho. Um traste! Um cara sem nenhum valor. Uma barata! Sonhava todas as noites com urubus devorando minha carne. Acordava suando e olhava para o homenzinho lá dentro ficando cada vez mais pequeno. Morrendo dentro de uma garrafa. Morrer é como estar dentro de uma garrafa. Entre um gole e outro de cachaça que compartilhava com os mendigos da Praça Independência, comecei então a compreender o valor da significância humana. Só depois que desaparecemos ou diminuímos de tamanho é que percebemos a nossa ínfima grandeza.

Numa manhã de quarta feira de cinzas, acordei e percebi que o anão havia se dissolvido. Tornara-se um líquido amarelado no fundo da garrafa. Literalmente um sêmen. Olhei o sol. Minha barriga doía. Veio-me a ideia de vender o sêmen do anão como um creme milagroso. Como fazia antes. Mas eu havia mesmo caído em descrédito total. Em desgraça. Não tinha mais força. Destruído, dirigi-me então à Ponte da Sete de Setembro e do seu alto, arremessei a garrafa no Igarapé podre que corria lá embaixo. Pronto! Tudo acabado. Havia me livrado definitivamente do anão. Agora eu podia me tornar  livre de meu egoísmo. Deixei a ponte e parei no primeiro boteco baleado que encontrei no caminho pra comemorar. Bebi tudo que me restava no bolso. Dancei, pulei, cantei marchinhas, xinguei o mundo. O carnaval mais triste da minha vida. Depois, apaguei. Ali mesmo. No chão fio de madeira, leproso.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE - PARTE VIII

 A PROFECIA DE JESUS SE CUMPRE

Era óbvio que cedo ou mais tarde o anão nos pregaria uma peça. O fenômeno tinha a ver com a sua estrutura física e fisiológica. Da Cruz diminuía de tamanho a cada ejaculada. Percebi por causa das roupas que lhe pareciam cada vez mais folgadas no corpo. A gala mais rala. Os tiros cada vez mais curtos. O que fazer agora? Levei o caso ao conhecimento do seu Tapajós, que por sua vez não acreditou muito. Provei a ele que o anão estava mesmo diminuindo. Propus a reduzir de três para duas ejaculadas por dia. Ou então conceder umas férias urgente para o anão poder descansar. Mas não houve acordo. E o anão continuou com seu show. Diminuía de tamanho cada vez mais. O quimono agora o engolia por inteiro. Ajudava-o a sentar na cadeira. A subir e descer do tablado. As ejaculadas diminuíram de três para duas. Depois de duas para uma. O anão foi perdendo a força. A graça. Não dava mais conta das ejaculações. Era como uma lâmpada enfraquecendo. Chegou á altura do meu joelho. Virou motivo de chacota. Vaias. As pessoas foram deixando de freqüentar o Delirium. Aquilo lá foi esvaziando. As pessoas queriam ver o anão ejacular; beber e banharem-se do seu Ganges sagrado. Seu Tapajós chegou comigo e sussurrou em meu ouvido:

“O senhor vai dar o seu jeito, seu Mário. Estamos até aqui de dívidas pra pagar.” Mas o que eu poderia fazer leitor? Aquilo era algo irreversível.
O anão agora media menos de três palmos de altura. As meninas já tinham dado o fora. O barco afundava. Uma noite, sem ter muito o que fazer, guardei o anão no bolso de minha camisa e foi minha vez de cair fora dali de mansinho. A negrinha que nunca mais tinha visto no meio de toda aquela confusão, surgiu no topo da escada. Achei que fosse me dedurar. Mas, sorrindo imbecilmente, queria apenas me mostrar os seus dentes novos, de ouro:

“Ah, vá à merda, negrinha!” E pulei fora dali pra nunca mais...

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE - PARTE VII


O FODA NÃO É A SUBIDA. É A QUEDA.

O anão enfim, foi anunciado. Bombom ficou onde estava. Já não se importava mais em se tornar alvo do anão. De receber sua gala. O tiro daquela vez foi certeiro em seu peito e ela foi jogada para trás com o impacto. O povaréu foi abaixo. Bombom ao chão, toda aberta, lambia agora com prazer o sêmen dourado do anão que lhe banhara todo o corpo. Lambuzara-se toda. O líquido escorria até a ponta do tablado caindo lentamente no piso de madeira. Disse brincando para um dos bebuns que bebia ao meu lado, que o sêmen do anão era sagrado. Uma espécie de chá alucinógeno mais potente que o Ayuasca. Foi o que eu disse. Ele correu para aparar com o copo. A notícia se espalhou. Logo todos queriam um pouco. Espremiam-se para receber goela abaixo o sêmen do anão. Eles acreditavam nisso. Alguns chegaram a afirmar que viam luzes douradas. Que se sentiam enormemente purificados. Naquele momento percebi o quanto é fácil enganar as pessoas. É por isso que as Igrejas existem. Ganhei alguns trocados extras comercializando o sêmen do anão no mercado negro. O Delirium nunca mais foi o mesmo. Todos os dias o lugar recebia um contingente imenso de punheteiros vindo de todos os pontos da cidade. Seu Tapajós passou a cobrar a entrada. E com isso, obviamente, foi entrando mais e mais dinheiro na casa. Tornei-me seu sócio. Sugeri que ampliássemos o lugar para comportar a multidão que jorrava casa à dentro. Seu Tapajós alugou o prédio ao lado. O lugar aumentou de tamanho. Uma a uma, as meninas voltavam: Mel Trepadeira, Joyce Bananinha, Bruninha Boquete, Fernandona Moedora de pica... Foram chegando mais e mais garotas querendo trabalhar na casa. Lembro-me de Mel. Era incrível. Escalava o ferro com sua buceta. Ia bem alto no céu e voltava. Daí a razão do apelido: Mel Trepadeira. Mel reclamava que a altura do ferro era pequena demais. Uma afronta. Podia ir mais longe. Sugeriu que aumentássemos o forro da casa. E foi o que fizemos. Àquela altura tínhamos bastante dinheiro no caixa. Mandávamos ver. Mandei construir um pequeno apartamento para mim e para o anão e passamos a morar naquele bordel. Na parte mais alta daquele prédio. Todas as manhãs, com uma doce ressaca, eu abria os janelões portugueses e via toda aquela parte da cidade: a Igreja Matriz, o porto Hidroviário, a cúpula do Teatro Amazonas, o Holland American Line ancorado, com toda sua pungência... Manaus nunca me foi tão bela. Tão fresca. Tão doce. Me senti o rei. Insolente. Esbanjador. Tinha dinheiro. Todas as mulheres que eu queria. Mulheres sujas. Mulheres limpas. Todos os buracos. Metia em todos os buracos. Metia. Metia. Metia. Metia mesmo pra valer, como se cada buraco daquele fosse o último da face da terra. Metia com fúria. Era como o anão ejaculando. Desisti de escrever. Não me interessava mais escrever. Queria só foder. Beber. Curtir! Para quê perder tempo escrevendo? Tentando ganhar a vida como escritor se eu tinha o mundo pela frente? Eu tinha agora uma janela nos altos de um sobrado na viela Mauá que se abria todos as manhãs para eu vislumbrar as estações daqueles anos loucos. Mas não pensem que esqueci do anão. Quando regressei de minha primeira e única viagem de férias da Ásia, trouxe-lhe do Japão um quimono dourado. Feito sob medida para ele. Estreou o quimono numa noite literalmente de gala. Ficou perfeito e alinhado no quimono que lhe dei. As putas o sediavam naquele quimono, mas ele sempre broxava. Cogitei que o problema tivesse na cabeça do anão. Algum trauma de infância, sei lá. Paguei-lhe uma profissional da área para cuidar da sua cabeça. A melhor da cidade. Mas não adiantou muito, não. O anão continuou broxando.
“Seu Mário – disse-me a psicóloga em seu consultório – o homem que broxa é o homem que se torna homem de verdade.” Não esqueço nunca mais aquelas palavras terríveis. Parei de me preocupar com isso. Da Cruz ejaculando e proporcionando felicidade a todos, era o que importava. Ele agora, metido em seu quimono dourado, ejaculava do tablado sobre a multidão. Todos se banhavam com o esperma do anão. Viam luzes. Visões. Lambiam-se como animaiszinhos. Alguns caíam de cara na poça dourada que se formava no chão de madeira. Prometi a Da Cruz, levá-lo para conhecer Catar no ano seguinte. Mas ficou só na promessa. O anão nem sonhando podia arrastar seus pészinhos dali. Ordem do seu Tapajós. E o tempo foi passando...
***
Um dia, Jesus foi ter comigo. Estava bastante abatido. Bebendo demais. Havia perdido definitivamente Cristal para um fiscal da receita que era comum e que freqüentava o Delirium. Queria minha ajuda:

“Fale com ela, seu Mário. Ela está cega. Tudo isso aqui vai passar.” Ouvia o insolente enrolado em meu robe indiano. Fumava meu cachimbo sossegado, olhando da varanda, a rua lá embaixo. Me sentia um autentico Al Capone decidindo o destino das pessoas. Todos vinham pedir conselhos. E aquele foi o mais idiota que ouvi:

“Olha, homem, Cristal não lhe ama. Por que não a deixa em paz e pare de sofrer como um idiota.” Disse pra ele. Jesus olhou-me daquele jeito e disse:


“Preste bem atenção, seu Mário: o problema não é a subida, é a queda.” E se foi mancando e balançando os terços. Fiquei com aquilo formigando na cabeça. Jesus era um idiota. Derrotado. Nunca foi com a minha cara mesmo. Depois daquela audiência, o sujeito relaxou de aparência completamente. Deixou a barba e o cabelo crescer. Andava sujo, em andrajos, pelos arredores da Matriz, parecendo um messias esquizofrênico. Pregava o dia inteiro na porta do Delirium, dizendo: “O anão é uma mentira! O anão é uma mentira! Mas ninguém lhe dava ouvidos. Havia aquele sorriso congelado em seu rosto. Quem levaria o cara a sério? O fato é que Jesus iniciou uma verdadeira cruzada contra o Delirium Drinks. Reunira em torno dele uns poucos séquitos que haviam se desmembrado da Igreja Universal, e numa tarde – como o exército de brancalione – a corja de fanáticos subiu enfurecida as escadas do bordel. Houve uma confusão danada. Jesus gritava gesticulava da porta: “O anão é uma mentira! O anão é uma mentira! Voltem às suas vidas!” Um dos bêbados tomando aquilo como um despropósito, arremessou Jesus escada abaixo. O infeliz torceu o pescoço e morreu. Fui olhar o corpo lá embaixo. Mesmo morto, ele ainda sorria. Não veio a polícia. Não veio o jornal. O investigador responsável pela investigação do crime, era frequentador da casa, e que portanto, não deu importância ao caso. Nem a própria Cristal que no mês seguinte, casara com o cara da Receita que era comum. Jesus era mais um esquizofrênico. E tudo voltou ao normal no Delirium. Sem mais aborrecimentos...

domingo, 29 de setembro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE - PARTE VI

 JESUS

No dia seguinte, voltamos lá. Demos com o lugar entupido de gente. As pessoas espremiam-se na escada. E com certeza não era por se tratar de uma sexta-feira. Dia de grande movimento na viela Mauá. Todos ali estavam para ver o anão ejacular. Tapajós já nos aguardava à porta:
“Como ele está hoje, seu Mário?”

“Revigorado, seu Tapajós!”

A peãozada olhou e riu quando entrei com o anão. Como de costume sentamos nos fundos, próximo ao extintor mais alegre. O lugar estava limpinho e com cheiro de Bom Ar. Mas logo ficaria sujo. Bem sujo e fedorento. Bombom fazia seu número costumeiro. Parecia mais lascívia. Ardente. O sêmen do anão havia tocado fundo o seu coração e a deixado mais profissional. Ela acenou sorrindo quando nos viu. Tapajós nos apresentou Cristal. Cristal era uma combinação de cabocla com cearense. Estatura mediana. Magra, olhos claros. Cabelos louros, encaracolados. Bem apanhada, a danadinha. Ficou na mesa com a gente. Calada. Tinha um ar mais atrevido que a de Bombom. Mas tinha sido bem adestrada. Tapajós sabia adestrar bem as suas meninas. Veio uma cerveja pra mesa. Os ventiladores trabalhavam espontaneamente e com mais vigor:

“O senhor notou como está a casa hoje, seu Mário?” Disse Tapajós, nos servindo.

“Bem agitada, hein, seu Tapajós?”

“Olhe, seu Mário, são anos ralando nesse lugar, desde que cheguei à Manaus, vindo de Tocantins. E eu confesso ao senhor que nunca vi a casa assim, saindo pelo ladrão. E isso aqui já foi bom, há uns anos atrás. As meninas eram ótimas. Novinhas, durinhas. A Mel Trepadeira, a Joyce Bananinha, a Bruninha Boquete, a Fernandona moedora de pica... Ah, isso aqui, seu Mário, era um paraíso. Todos vinham para cá deixar seu santo dinheirinho. Mas depois, assim, num piscar de olhos, veio a crise e isso aqui decaiu. As meninas debandaram. Uma revoada de periquitos. Aquilo me  partiu o coração. Só me restaram a Bombom, Cristal e a negrinha que é só cobrir-lhe o rosto com a bandeira do Brasil e pronto! Mas já estão cansadas e emburradinhas. Me dão prejuízo. E olhe o senhor que sou um pai. Chegam às pencas do interior, perdidinhas e maltratadas, e eu acolho todas elas. A negrinha, por exemplo, chegou estragadinha do Anori. Dentes podres. Um hálito do cão. Cuidei dela e hoje ganha honestamente o pãozinho dela. Sonha com dentes de ouro, a pobrezinha. Bombom e Cristal é o que eu tenho de melhor por aqui. Seguram as pontas. De fé. Aí o senhor me aparece com este anão e olhe o resultado agora. Olhe pra isso, seu Mário! A casa cheia. Vamos faturar muita grana, meu  amigo. Eu lhe digo!”
Fiquei animado também e tomei uma golada da minha cerveja. Tapajós continuou falando com nostalgia. Falou da sua vida. Da sua luta. As pessoas estavam impacientes para ver o anão ejacular. Passei discretamente minhas mãos nas coxas de Cristal e ela não disse nada. Estava séria. Sem dizer uma palavra. Fiquei ali brincando com os meus dedos como quem não quer nada bem na entrada da sua buceta. Meu pau já era um ferro em brasa. Mais gente chegava. Vi quando Jesus entrou. Moreno-claro, alto, magro. Trazia enrolado nos punhos, um punhado de terços. Uma figura, este Jesus. Sobrevivia dos terços que vendia nos puteiros e morria de amores por Cristal. Chegou ao desatino de pedir-lhe em casamento. Parado à porta, ele erguia a vista procurando por Cristal. Não largava o osso um só instante. Outro aspecto interessante no moço Jesus é que mancava de uma das pernas e não parava de sorrir. Sorria o tempo todo. Mesmo quando estava triste. Ferido. Viria saber mais tarde que Jesus tinha um problema nos músculos faciais decorrente de um derrame que sofrera e que o deixou para sempre com aquele sorriso idiota congelado na cara. Jesus freqüentava o Delirium desde as vacas gordas. Vivia juntando dinheiro para comprar uma casa e tirar Cristal da lama. Mas Cristal só queria tirar proveito do seu coração. Não amava Jesus. Embora ele fosse o seu melhor cliente, ela nunca o amou de verdade. “E agora mais este me querendo roubar a Cristal.” Reclamou seu Tapajós, levantando-se.

“O selior é o plai dlu anão?” Perguntou Cristal. Falava engraçado, Cristal. Tinha a língua presa. Cuspi longe minha cerveja querendo rir. Controlei-me.

“Não, minha querida. Apenas amigos. Sou seu empresário agora.”

“É vledade qlele gloza longi?”

“É sim, meu anjo.”

"Mlas, asxim, dlaqui?”

“Dessa mesma distancia de onde nós estamos agora, bebê.”


“É plaplo dlo selior.” (Francamente não sei se reproduzi bem a fala de Cristal, mas enfim.) Jesus sentou em uma mesa próxima e acenou pra Cristal balançando os terços. Sorria como um idiota. Por dentro, queimava em ciúmes. Não foi com minha cara, não, este Jesus. Não conseguia conceber como um homem podia viver daqueles terços. Balançava os terços demonstrando impaciência. Cristal pediu licença com sua fala engraçada e foi até ele. Precisava trabalhar. Era bastante gostosa, Cristal. E como rebolava. Mas eu ainda tinha a Bombom. E ela estava impossível àquela noite. Fazia sua performance com uma garrafa de cerveja simulando uma masturbação. Estava bêbada. Alegre. Sentia de longe seu cheiro de puta no cio. Agora sim, parecia uma mulherzinha de verdade. Valente. Corajosa. Mais gente chegava. A casa já inteiramente tomada. A grande horda acotovelava-se pelo salão. O chão de madeira do Delirium tremia. Seu Tapajós andava de um lado para outro esfregando as mãos. Olhei para Da Cruz e notei que seu pensamento estava longe. Ele olhava triste vendo o globo girar. Falava pouco, o anão. Até ali, não havia notado nada de errado com o meu camaradinha. Só mais tarde, é que eu viria perceber algo de muito estranho que se processava nele cada vez que esporrava. Algo que me tiraria o sono. O sono de todos. Mais calma, outra vez! Isto é mais pra frente...

O ANÃO DO AÇOUGUE - PARTE VII

JESUS

No dia seguinte, voltamos lá. Demos com o lugar entupido de gente. As pessoas espremiam-se na escada. E com certeza não era por se tratar de uma sexta-feira. Dia de grande movimento na viela Mauá. Todos ali estavam para ver o anão ejacular. Tapajós já nos aguardava à porta:
“Como ele está hoje, seu Mário?”

“Revigorado, seu Tapajós!”

A peãozada olhou e riu quando entrei com o anão. Como de costume sentamos nos fundos, próximo ao extintor mais alegre. O lugar estava limpinho e com cheiro de Bom Ar. Mas logo ficaria sujo. Bem sujo e fedorento. Bombom fazia seu número costumeiro. Parecia mais lascívia. Ardente. O sêmen do anão havia tocado fundo o seu coração e a deixado mais profissional. Ela acenou sorrindo quando nos viu. Tapajós nos apresentou Cristal. Cristal era uma combinação de cabocla com cearense. Estatura mediana. Magra, olhos claros. Cabelos louros, encaracolados. Bem apanhada, a danadinha. Ficou na mesa com a gente. Calada. Tinha um ar mais atrevido que a de Bombom. Mas tinha sido bem adestrada. Tapajós sabia adestrar bem as suas meninas. Veio uma cerveja pra mesa. Os ventiladores trabalhavam espontaneamente e com mais vigor:

“O senhor notou como está a casa hoje, seu Mário?” Disse Tapajós, nos servindo.

“Bem agitada, hein, seu Tapajós?”

“Olhe, seu Mário, são anos ralando nesse lugar, desde que cheguei à Manaus, vindo de Tocantins. E eu confesso ao senhor que nunca vi a casa assim, saindo pelo ladrão. E isso aqui já foi bom, há uns anos atrás. As meninas eram ótimas. Novinhas, durinhas. A Mel Trepadeira, a Joyce Bananinha, a Bruninha Boquete, a Fernandona moedora de pica... Ah, isso aqui, seu Mário, era um paraíso. Todos vinham para cá deixar seu santo dinheirinho. Mas depois, assim, num piscar de olhos, veio a crise e isso aqui decaiu. As meninas debandaram. Uma revoada de periquitos. Aquilo me  partiu o coração. Só me restaram a Bombom, Cristal e a negrinha que é só cobrir-lhe o rosto com a bandeira do Brasil e pronto! Mas já estão cansadas e emburradinhas. Me dão prejuízo. E olhe o senhor que sou um pai. Chegam às pencas do interior, perdidinhas e maltratadas, e eu acolho todas elas. A negrinha, por exemplo, chegou estragadinha do Anori. Dentes podres. Um hálito do cão. Cuidei dela e hoje ganha honestamente o pãozinho dela. Sonha com dentes de ouro, a pobrezinha. Bombom e Cristal é o que eu tenho de melhor por aqui. Seguram as pontas. De fé. Aí o senhor me aparece com este anão e olhe o resultado agora. Olhe pra isso, seu Mário! A casa cheia. Vamos faturar muita grana, meu  amigo. Eu lhe digo!”
Fiquei animado também e tomei uma golada da minha cerveja. Tapajós continuou falando com nostalgia. Falou da sua vida. Da sua luta. As pessoas estavam impacientes para ver o anão ejacular. Passei discretamente minhas mãos nas coxas de Cristal e ela não disse nada. Estava séria. Sem dizer uma palavra. Fiquei ali brincando com os meus dedos como quem não quer nada bem na entrada da sua buceta. Meu pau já era um ferro em brasa. Mais gente chegava. Vi quando Jesus entrou. Moreno-claro, alto, magro. Trazia enrolado nos punhos, um punhado de terços. Uma figura, este Jesus. Sobrevivia dos terços que vendia nos puteiros e morria de amores por Cristal. Chegou ao desatino de pedir-lhe em casamento. Parado à porta, ele erguia a vista procurando por Cristal. Não largava o osso um só instante. Outro aspecto interessante no moço Jesus é que mancava de uma das pernas e não parava de sorrir. Sorria o tempo todo. Mesmo quando estava triste. Ferido. Viria saber mais tarde que Jesus tinha um problema nos músculos faciais decorrente de um derrame que sofrera e que o deixou para sempre com aquele sorriso idiota congelado na cara. Jesus freqüentava o Delirium desde as vacas gordas. Vivia juntando dinheiro para comprar uma casa e tirar Cristal da lama. Mas Cristal só queria tirar proveito do seu coração. Não amava Jesus. Embora ele fosse o seu melhor cliente, ela nunca o amou de verdade. “E agora mais este me querendo roubar a Cristal.” Reclamou seu Tapajós, levantando-se.

“O selior é o plai dlu anão?” Perguntou Cristal. Falava engraçado, Cristal. Tinha a língua presa. Cuspi longe minha cerveja querendo rir. Controlei-me.

“Não, minha querida. Apenas amigos. Sou seu empresário agora.”

“É vledade qlele gloza longi?”

“É sim, meu anjo.”

“Mlas, asxim, dlaqui?”

“Dessa mesma distancia de onde nós estamos agora, bebê.”


“É plaplo dlo selior.” (Francamente não sei se reproduzi bem a fala de Cristal, mas enfim.) Jesus sentou em uma mesa próxima e acenou pra Cristal balançando os terços. Sorria como um idiota. Por dentro, queimava em ciúmes. Não foi com minha cara, não, este Jesus. Não conseguia conceber como um homem podia viver daqueles terços. Balançava os terços demonstrando impaciência. Cristal pediu licença com sua fala engraçada e foi até ele. Precisava trabalhar. Era bastante gostosa, Cristal. E como rebolava. Mas eu ainda tinha a Bombom. E ela estava impossível àquela noite. Fazia sua performance com uma garrafa de cerveja simulando uma masturbação. Estava bêbada. Alegre. Sentia de longe seu cheiro de puta no cio. Agora sim, parecia uma mulherzinha de verdade. Valente. Corajosa. Mais gente chegava. A casa já inteiramente tomada. A grande horda acotovelava-se pelo salão. O chão de madeira do Delirium tremia. Seu Tapajós andava de um lado para outro esfregando as mãos. Olhei para Da Cruz e notei que seu pensamento estava longe. Ele olhava triste vendo o globo girar. Falava pouco, o anão. Até ali, não havia notado nada de errado com o meu camaradinha. Só mais tarde, é que eu viria perceber algo de muito estranho que se processava nele cada vez que esporrava. Algo que me tiraria o sono. O sono de todos. Mais calma, outra vez! Isto é mais pra frente...

sábado, 28 de setembro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE - PARTE V

CARALHO, EU NUNCA VI ISSO!

Era uma tarde de muito calor. Asfixiante mesmo. Subimos as escadas de um stripper que ficava nos altos de um casarão antigo no centro de Manaus. Chamava-se Delirium Drinks. Lugar pequeno e abafado, mergulhado numa penumbra vermelha. Ventiladores trabalhavam emburrados. Um cheiro de cêcê, sebo de pica, urina e suor. Mas foi o que conseguimos de melhor uma hora daquelas. E o anão parecia não ligar muito para todo aquele fedor escroto. Sentados nos fundos, próximos a um extintor desempregado, meu amiguinho tinha os olhos atentos e cheios de libidinagem. Reparava em tudo a sua volta. Uma puta nos serviu a cerveja. Era baixinha e tinha os peitões pulados pra fora do vestido sem alça. O anão não tirava os olhos deles. As pessoas olhavam para nós. Logo nos tornaríamos a atração do lugar. Depois de um tempo ali não sentíamos mais o fedor. Éramos parte da mesma merda. A puta que nos servira a cerveja subiu no pequeno tablado e iniciou o seu número. Relaxei. Ah, como eu adorava àquelas tardes quentes e solitárias daqueles prostíbulos fedidos nos arredores do cais. Se pudesse, ficaria ali sentado para sempre, só bebendo. Sem esperar absolutamente nada da vida. Ela podia seguir sem mim. Tanto fazia. Eu tinha agora o anão. E ele já havia nesse instante puxado o seu pau pra fora e iniciado uma punheta alucinante: flap flap flap – eu ouvia fortemente aquele barulho. Eram como pisadas secas de sandálias num chão duro. Inútil tentar impedi-lo. Um cara se aproximou pra olhar. Depois um outro. Vários. O anão continuou se masturbando com fúria. Indiferente. Ninguém ligava mais para a dançarina. Ela mesma parou de dançar para olhar. O anão estava cercado de curiosos. “Ele vai gozar! Ele vai gozar!” Alguém gritou. A platéia afastou-se e o jato dourado jorrou longe e potente atingido o tablado onde se encontrava a puta. A gala espessa acertou-lhe em cheio o ventre. O impacto arremessou-lhe ao chão. “Caralho, eu nunca vi isso!” Alguém falou. Veio uma cerveja pra mesa. Depois outra. Horrores. Veio cigarros também. E é claro, a dançarina atingida, acompanhada de um sujeito alto e gordo; muitos cordões no pescoço, cara de traficante.
“Foi ele, seu Tapajós! Apontou para o anão. Da Cruz pediu desculpas, envergonhado. Disse que era algo que ele não podia controlar. A puta mascava chicletes enfurecida:
“Relaxa, Bombom! Dá um trato no anão e deixa o resto comigo.”  Disse o sujeito gordo dos cordões para a garota. Era o dono da espelunca. Imaginei rolando as escadas com o anão. Mas o sujeito sentou na nossa mesa. Bombom pegou na mão do anão e o conduziu para um dos quartos que ficava nos fundos.
“O papo agora é reto, camarada!” Disse ele arredando sua cadeira para mais junto de mim. Senti dessa vez um cheiro de queijo rançoso. Acendi um cigarro. Uma puta no canto assoava o nariz. Era negrinha e tinha o olhar triste e doce de quem acabara de sair de uma senzala.
“Pois diga!”

“O anão é parente seu?”

“Apenas amigos!”

“Ele ejaculou em uma das minhas meninas.”

“O senhor me desculpa!”

“Como ele faz isso?”

“Não sei. Simplesmente sai!”

“Mas a esta distancia? Já pensou em ganhar dinheiro com ele?”

O cara havia pensado minha ideia. Não soube responder.

“Acha que ele pode esporrar mais longe?”

“Melhor não forçar.”

“Quero ver ele esporrar!” Pareceu uma ordem. Não demorou nem dez minutos, Bombom trazia de volta o anão pelas mãos.

“O que houve?” Quis saber o sujeito dos cordões.

“O anão broxou, patrão!”

“Porra, Da Cruz!” Eu disse. Em resposta, a criaturinha encolheu os ombros.

“Vá, vá, vá, que é isso, o cara também não é nenhum super homem. Senta aí, Da Cruz, e pede alguma coisa pra beber.” Disse Tapajós tentando atenuar a situação. Voltamos a negociar.

“Acha que o anão consegue esporrar outra vez?” Virei para o anão:

“Consegues, Da Cruz?” Da Cruz fez que sim, balançando animadinho a cabeça.

“Quede a Cristal?” Perguntou Tapajós para Bombom.

“No quarto, com Jesus!”

“Este não desiste. Vai tu mesmo!”

“Porra, seu Tapajós, virei tiro ao alvo de anão agora, foi?”

“Não reclama, caralho. Põe um sorriso nesse rosto duro e vai trabalhar.”

Bombom caminhou contrariada para o tablado. Bombom era baixa e atarracada. Bundinha empinada. Estilo patinha. Um belo produto de Codajás. Subiu no tablado. Tapajós pediu pro DJ anunciar que o anão ia esporrar. Os bebuns se ajeitaram para ver. Um bando de punheteiros derrotados. Bombom iniciou sua dança erótica ao som de um bate estaca. O anão puxou o pau pra fora outra vez:

“Diz pra ele não ter pressa.” Recomendou seu Tapajós.

“Sem pressa, Da Cruz.” Mas ele já estava batendo. O mesmo ritmo. A mesma intensidade. As maõszinhas do anão trabalhavam ao ritmo da música. Tapajós aproveitou e pegou um cigarro meu. Bombom mexia-se no tablado. O anão punhetava-se. Mais e mais. “Bizonho, Bizonhudo, Bizonhão. Filhodumaégua!” O anão murmurava. Consegui ouvir o que ele dizia dessa vez. Eram só bobagens. Delirava. Parecia possuído por uma força sobrenatural. Seu rosto havia se transformado. Uma feição horrenda. Demoníaca. Como se fosse ejacular toda sua fúria sobre o mundo. Tapajós não tirava os olhos do pau do anão. Estava preocupado.

“Diz pra ele ir mais devagar, porra!” Já havia um cerco de curiosos em sua volta. Bombom mandava ver no palco. Ninguém ligava pra ela. Entramos em transe todos nós.

“Diz pra ele ir devagar! Pra ir devagar!” Falava Tapajós, apertando-me os pulsos. Mas o anão não dava ouvidos. Acelerava mais e mais. Dizia aquelas bobagens novamente: Bizonho! Bizonhudo! Bizonhão! Filhadumaégua” Bombom girava em volta do ferro. Sozinha. Largada. Vendo ela ali, desamparada – abraçada ao ferro – meu pau logo endureceu. Um globo pobre girava. A negrinha veio ver. Riu do anão, levando a mãozinha à boca. Assoou o nariz. Imaginei ganhando muito dinheiro com o anão. Gozando do bom e do melhor que o dinheiro pode proporcionar à um mortal. Não me preocuparia mais em ir atrás de empregos. Me humilhar para um bando de filhas das putas que só exploram. O anão era minha galinha dos ovos de ouro. Milha “Ilha do Tesouro”, do Stevenson. Pensava nessas coisas. Enquanto ele punhetava-se, eu sonhava. Um dos bebuns aproveitou para bater uma punheta também. Encostada ao ferro, Bombom arregaçou a xota. Achei que estivesse simulando uma siririca. Mas ela levava à sério a brincadeira. Seus dedinhos estavam realmente enfiados em sua buceta. Aproveitei para bater uma punheta vendo Bombom bater siririca. Olhei e vi um cara de joelhos chupando o pau do DJ. Alguém avançou na negrinha. Putaria geral. O anão inspirava à todos. Até seu Tapajós resolveu bater uma. Pediu pro anão enfiar o dedo no seu cu. Começou bater uma com o dedo do anão enfiado no seu cu. Tremenda putaria. Eu mandava ver na punheta. Bombom na siririca. Os caras revezando na negrinha. Gemidos. Suruba coletiva. É, foi. E você não acredita, né, leitor? Nem peço-lhe que acredite. Paciência. Mas eu estava lá e vi tudo. Juro que vi! O anão tinha os olhos revirados. Pedia passagem com as mãos. Iria ejacular. Mirou bem o pau: UM-DOIS-TRÊS E POW!!, lançou bem longe o jato dourado que passou zunindo em nossos ouvidos. Não fosse Bombom abaixar-se há tempo, o jato dessa vez lhe acertaria em cheio a cara. Olhei. Um a um todos foram esporrando. Nunca vi tanta gala saindo de uma vez só. Tanta meladeira junta. A punheta de suas vidas. Fui o último a esporrar olhando Bombom batendo siririca. Ela também gozou esfregando-se no ferro. Não vi a negrinha. Depois daquele transe, todos se olhavam desconfiados. Mas, felizes. Conversavam agora uns com os outros em perfeita comunhão. Tapajós fumava um cigarro pra disfarçar. Tudo foi voltando ao normal. O DJ desencavou o Conga La Conga da Gretchen e todos puseram-se a dançar animados. Tapajós e eu voltamos a negociar. Três ejaculações do anão por dia, R$50,00 por cada esporro, pra começar. Cento e cinqüenta vezes seis daria por semana... 900,00. O que me renderia no mês, R$ 3.600. Eis aí todo o sentido da contabilidade. Um salário que nunca sonhei em ganhar em toda minha vida de cachorro fodido e explorado nessa terra. Fechamos negócio. O anão não se importou. Parecia natural para ele. O problema viria mais tarde, como os senhores verão. Mas, calma! Vieram mais cervejas pra mesa. Horrores. Da Cruz e eu deixamos o Delirium, cambaleantes.